por Redação PerifaCon
A paixão nacional das novelas e como os LGBTQIA+ estão nelas
Estamos em 2023, está na hora do personagem gay parar de ser feito por um cara hetero com trejeitos afeminados, né?
A representatividade LGBTQIA+ em novelas e outros programas de televisão tem sido uma questão discutida nos últimos anos. Embora tenha havido avanços significativos na inclusão de personagens LGBTQIA+ em diferentes produções, é importante reconhecer que ainda existem desafios a serem enfrentados. Personagens dentro da comunidade existem abertamente desde os anos 1970, como por exemplo o Seu Peru da Escolinha do Professor Raimundo, mas será que o papel sempre será ligado às risadas?
Em relação às novelas, historicamente, a representação de personagens LGBTQIA+ foi limitada e, muitas vezes, estereotipada. Personagens gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros frequentemente eram retratados como alívio cômico, cujo principal objetivo era gerar risadas por meio de estereótipos e piadas preconceituosas. Majoritariamente representados por atores e atrizes heterossexuais, os personagens pouco tinham de desenvolvimento ou história própria, e em muitas situações, deixavam de ser LGBTQIA+ em algum momento. Essa representação reducionista dos personagens perpetuava estigmas e contribuía para a marginalização e a discriminação enfrentadas pela comunidade. Pensar que em Tieta de 1990 a personagem de Betty Faria já falava que os gays não eram diferentes e muito pouco mudou hoje em dia.
No entanto, nos últimos anos, tem havido uma mudança gradual no panorama da representação LGBTQIA+ na mídia, incluindo as novelas. Alguns programas começaram a abordar questões relacionadas à diversidade sexual e de gênero de forma mais respeitosa e inclusiva. Personagens LGBTQIA+ estão sendo retratados com mais profundidade e complexidade, explorando suas experiências de vida, relacionamentos, desafios e conquistas, em vez de apenas servirem como alívio cômico. Um exemplo pode ser o personagem Ivan de A Força do Querer de 2017, mesmo interpretado por uma atriz cisgênera (e lésbica na vida real), Carol Duarte, a jornada de aceitação da identidade de gênero foi feita de maneira séria, mostrando os conflitos internos da personagem com a sua família, a sociedade e principalmente consigo. Em casos mais atuais, o assunto da transexualidade, com atuação de atrizes trans, foi tratado em A Dona do Pedaço (2019) e Terra e Paixão (2023, mesmo que na primeira ainda de uma forma menos aprofundada e ainda cômica, mas a novela tinha esse tom mais “leve”, e na segunda ligado à outra questão, a prostituição.
Essa representação mais autêntica e positiva tem o potencial de aumentar a empatia e a compreensão da audiência em relação às questões enfrentadas pela comunidade LGBTQIA+. Além disso, ao retratar personagens LGBTQIA+ como protagonistas de suas próprias histórias, e não só como adereço, pode mostrar a gama de possibilidades que uma pessoa LGBTQIA+ possui. Um caso que começou muito bem e, mesmo fazendo sucesso, caiu no humor foi o de Félix, interpretado por Matheus Solano (um ator heterossexual) em Amor à Vida de 2013, O personagem, cheio de trejeitos, tinha uma história, era um vilão com diversas camadas, terminou como um vilão cômico? Sim, mas não foi um personagem unilateral.
É importante ressaltar que a representatividade LGBTQIA+ na mídia deve ser diversa e abranger diferentes orientações sexuais, identidades de gênero e experiências. Além disso, é fundamental que os profissionais envolvidos na criação das novelas e demais produções audiovisuais consultem e envolvam membros da comunidade LGBTQIA+ para garantir uma representação autêntica e evitar estereótipos prejudiciais.
Embora ainda haja muito trabalho a ser feito, a crescente representatividade LGBTQIA+ em novelas e outros programas de televisão é um passo importante na direção da inclusão e do reconhecimento das vozes e vivências da comunidade. Por isso, é importante contar essas histórias com pessoas que possuam essas vivências, para que os personagens tenham embasamento o bastante para trazer a emoção necessária e deixarem de ser apenas coadjuvantes que estão ali para algumas risadas.
Nota do autor: Os exemplos aqui utilizados focaram muito em programas da Rede Globo, pois, infelizmente, é a única que atualmente ainda tenta inserir personagens LGBTQIA+ em suas tramas em rede nacional.
Texto por Guilherme de Araujo. Siga o colunista nas redes sociais