Banner 6 setembro, 2024
por Redação PerifaCon

SOLTA O LAQUÊ, ABRAVANEL: ‘Hairspray’ faz estreia promissora em São Paulo

O musical traz consigo uma trama problemática apresentada por um elenco de tirar o fôlego

 

Texto por: Vinicius Favorito

Existem duas formas diferentes de fazer uma crítica para “Hairspray” e eu gostaria de trazer cada uma para esse texto. Apresentado pelo Ministério da Cultura e Brasilprev e estrelando Tiago Abravanel e Vânia Canto, essa nova produção é, sem exagero, um espetáculo que se destaca entre os musicais da temporada — ainda mais tendo grandes nomes em cartaz em São Paulo neste segundo semestre, como os sucessos “Dear Evan Hansen” e “Legalmente Loira”.

A trama segue os passos de Tracy Turnblad (Vânia Canto) que, apesar de não cumprir com os padrões de beleza, tem o desejo de estar na TV junto dos “brotos legais” da época. Sua mãe Edna (Tiago Abravanel) é contra os delírios da filha por achar que vão zombar dela, mas a garota se agarra no sonho e faz o que é preciso para ser vista em preto e branco numa tela de 8 polegadas junto do galã Link Larkin (Rodrigo Garcia), da amarga Amber Von Tussle (Verônica Goeldi) e todos os outros esbeltos do programa do Corny Collins (Ivan Parente)

Contando com os números “Bom Dia, Baltimore” (Good Morning, Baltimore), “Mama, Não Sou Mais Bebê” (Mama, I’m a Big Girl Now), “Sinos a Tocar” (I Can Hear the Bells) e o grande hit “Não Dá Pra Parar” (You Can’t Stop the Beat), conseguimos ver o cuidado que a equipe criativa teve em trazer o melhor de cada uma das músicas nas versões brasileiras. Quem é fã do musical não vai sentir saudade das originais, pois tudo está muito bem amarrado e bem feito. 

Mas agora peço licença para fazer uma curva na minha crítica. “Hairspray” tem o grande problema do Complexo do Branco Salvador — tropo muito famoso até hoje em filmes, livros e outros produtos da mídia. Por vezes, a história parece querer nos convencer que a gordofobia sofrida pelas protagonistas brancas pode se comparar com o racismo que mais da metade dos personagens sofrem. 

É importante dizer que o espetáculo se passa durante o período da segregação racial da década de 1960 nos Estados Unidos e que esse é um ponto relevante para o desenvolvimento da história; ou pelo menos é o que ela tenta nos fazer acreditar enquanto nos entrega uma versão enbranquecida do Movimento de Direitos Civis. De forma muito vaga eles abordam o tema e fica até difícil não abraçar as intenções do enredo quando “Eu Sei De Onde Eu Vim” (I Know Where I’ve Been) é entoada pela Maybelle (Aline Cunha), uma personagem preta. Mas quem entende minimamente de lutas raciais pode sentir certo desconforto quando esses momentos forem rapidamente apagados com um maior, mais brilhante e animado número musical liderado pelos personagens brancos logo na sequência. 

foto: Divulgação

Por outro lado, a nova produção brasileira não tinha muito o que fazer com o roteiro que já chegou pronto da Broadway. Alterar esses pontos afetaria a trama de formas irreparáveis, então eles compensam esse terrível desfalque sobre a pauta racial entregando a melhor performance que o público já viu — durante 6 vezes na semana. 

O elenco tem um preparo fenomenal e um jeitinho brasileiro de fazer arte que dá gosto de ver. Dava para escutar os suspiros do público sempre que Thales Cesar (Seaweed Stubbs) gingava ou quando Thais Ribeiro, Carol Roberto e Larissa Noel (As Diamantes) entravam no palco com vestidos brilhantes harmonizando suas vozes. 

Quando em cena, os artistas estão sempre 100% imersos no que estão fazendo, tanto que eu recomendo você voltar mais de uma vez para poder pescar todos os detalhes que perdeu enquanto conferia o outro canto do palco. 

Quero destacar o trabalho de Pamela Rossini (Penny Pingleton), que se faz impossível de tirar os olhos com todos os cacos que colocou na personagem, Giovana Zotti (Prudy Pingleton), que tem um dos timings de comédia mais brilhantes do elenco, e Lindsay Paulino (Wilbor Turnblad), que quando está em cena deixa a gente ansioso para saber de qual forma vai arrancar gargalhadas do público. 

Em resumo, a nova versão de “Hairspray” é imperdível, impecável e impossível de parar. O musical estreou no dia 5 de setembro e vai até a segunda semana de outubro, então se apressem para ver antes que todo o Teatro Renault fique intoxicado com o tanto de spray de cabelo que é usado para manter as perucas do elenco no lugar pelas 3h de espetáculo.

SERVIÇO

“Hairspray” em São Paulo

Onde: Teatro Renault — Av. Brigadeiro Luís Antônio, 411, República, São Paulo (SP)

Quando: de 5 de setembro a 13 de outubro

Ingressos: disponíveis no site da Tickets For Fun (T4F).