Notícias 16 fevereiro, 2024
por Redação PerifaCon

Horizonte, um filme onde a jornada vale mais do que o sentido

A estreia de Rafael Calomeni na direção revela uma bela surpresa enquanto disserta sobre o peso do luto e a chama de viver. Uma jornada emocionante que nos lembra da beleza que pode surgir das cinzas da dor

 

Texto por: Hyader Epaminondas

Rafael Calomeni, em sua estreia como diretor, com Dostoiewski Champangnatte no roteiro, realiza um excelente recorte poético sobre a vida. Demonstrando segurança em sua abordagem, Calomeni toma o tempo necessário para construir e apreciar a trama, utilizando toda a sensibilidade exigida para narrar uma jornada que explora temas como a complexidade dos relacionamentos familiares e conflitos geracionais enquanto dança com as consequências do luto e da vitalidade do amor.

Ele se aconchega numa representação de primeiros amores genuína, indo além da idade ao trazer reflexões contemporâneas sobre qualidade de vida e a melhor forma de vivenciar o presente. Acompanhado por uma estética louvável e palatável, repleta de brasilidade, o filme incorpora o estilo cinematográfico de observação, onde as reações dos personagens se destacam, se tornando tão cruciais quanto os diálogos para contar o que não está sendo simbolizado em cena.

A trilha sonora e a sonoplastia complementam essa experiência visual, criando uma atmosfera sensorial lúdica ao trazer canções populares como um personagem escondido proclamando simbolicamente os desejos e anseios dos personagens.

Esse enfoque na expressão não verbal dos personagens adiciona uma camada mais à experiência, permitindo que o público mergulhe nas emoções e significados subjacentes à história enquanto se apaixonam pelos protagonistas sob a canção “Boneca Cobiçada” de Milionário & José Rico, interpretada de forma apaixonada pelo protagonista interpretado por Raymundo de Souza.

A estética da obra é notável, imbuída de uma brasilidade marcante que ressoa através do som estridente, guiado pela harmonia da voz e do violão. No entanto, o filme encontra momentos de desorientação, especialmente com cortes bruscos que encerram a narrativa de forma abrupta, contrariando as expectativas e o desenrolar da história. Essas lacunas aparentemente inexplicáveis são, no entanto, uma escolha deliberada do diretor.

Em um ponto crucial, o protagonista verbaliza a potência de sentir sem a necessidade de compreender os motivos por trás dessas emoções, desafiando o público a aceitar essa abordagem e permitindo que a subjetividade prevaleça. O cerne da história reside na eclosão de um romance na terceira idade, simbolizando o renascimento de Rui.

No entanto, a catarse para o personagem ocorre previamente, quando ele decide enfrentar o luto pelas pessoas que partiram antes dele. Esse processo transformador redefine a perspectiva de Ruy, que anteriormente se encontrava em um estado de desconforto e isolamento, abandonado pelos entes queridos. A interpretação belíssima de Raymundo de Souza transmite essa mensagem de renascimento de forma avassaladora, especialmente através do seu olhar, agora direcionado para além do horizonte.

Na trama, o luto emerge como um segundo arco narrativo de maneira sutil e cuidadosa, como se fosse um fio invisível que tece as emoções do protagonista. A narrativa, embora centrada na eclosão de um romance na terceira idade, reserva espaço para explorar as complexidades do luto de forma discreta. O protagonista, Rui, enfrenta um processo de perda que se desdobra silenciosamente ao longo da história, revelando como um componente essencial de sua jornada para a compreensão de seu desfecho.

Rafael Calomeni esconde esse aspecto de propósito, permitindo que o público descubra gradualmente as camadas mais profundas da dor que Rui carrega. Essa abordagem subliminar adiciona uma dimensão poética à narrativa, à medida que o luto se torna um elemento intrínseco ao renascimento do personagem, moldando sua transformação de maneira tão comovente quanto reflexiva.A sutileza com que o filme explora o luto como um segundo arco narrativo em “Horizonte” enriquece a experiência até o subir dos créditos, proporcionando uma contemplação delicada sobre a natureza como um retalho de momentos da perda e de renascimento.