Banner 17 outubro, 2024
por Redação PerifaCon

Favela nos Games: Inclusão e Transformação Social

Andreza Delgado e Guras discutem como a periferia está rompendo barreiras no cenário gamer,mas também enfrentando a exclusão e a falsa diversidade promovida por empresas do setor.

 

Fotos por: Pierre Augusto. Texto por: Milena Guimarães

Durante a Brasil Game Show, tivemos a oportunidade de cobrir um painel relevante que abordou a temática “Favela nos games”, com a participação de duas figuras influentes: Andreza Delgado, influenciadora e idealizadora da Perifacon, e Guras, streamer e criador de conteúdo. O bate-papo explorou os desafios, as vitórias e as perspectivas de um cenário onde as favelas e periferias se destacam como berço de talentos e protagonistas na cultura gamer.

A esquerda Guras e a direita Andreza/ foto: Pierre Augusto

Favela como berço de talentos

Guras trouxe a perspectiva dos e-Sports, citando como as favelas são uma fonte de talentos em ascensão. Ele ressaltou que o que falta, muitas vezes, são projetos que incentivem esses jovens a ingressarem no mundo dos games de forma profissional. 

Ele acredita no poder dos games para transformar vidas e promover mudanças sociais. A chave para isso, segundo Guras, é criar possibilidades de contato com os games, algo que vem mudando gradualmente com a inclusão de jogos como o free fire, que se popularizou justamente por ser acessível em dispositivos móveis, sem depender de um computador potente.

Perifacon: inclusão e representatividade nos games

Andreza, à frente da Perifacon, explicou como o evento tem o objetivo central democratizar o acesso à cultura geek, inicialmente com dificuldade de entender como entrar no mundo dos games, mas que, desde sua primeira edição, já buscava espaços para desenvolvedores de jogos e fez parcerias estratégicas, como com a Garena, criadora do Free Fire. “O foco não era apenas trazer o mainstream para a favela, mas também abrir portas para que as pessoas da periferia tivessem a chance de desenvolver seus próprios jogos”. Para ela, o que o cenário precisa é acabar com a ideia de que a periferia não consome cultura geek e gamer.

A responsabilidade pela criação de oportunidades e circulação de informações é tanto privada quanto pública. É preciso ampliar o horizonte da periferia e transformar o mercado com projetos que realmente façam a diferença.

A luta contra o preconceito e a importância da representatividade

Quando a conversa se voltou para a questão da representatividade, tanto Andreza quanto Guras foram enfáticos: é necessário que os jogos carreguem a diversidade de histórias e perspectivas. Para Guras, o free fire, por ser um jogo acessível e que dialoga diretamente com o público das favelas, se tornou uma plataforma de oportunidade e crescimento para muitos jovens.

Andreza, por sua vez, destacou o papel crucial que o audiovisual tem na mudança de percepções, e como os jogos podem (e devem) contribuir para isso. Ela lamentou que muitos games ainda perpetuam estereótipos, algo que precisa ser combatido. “Se você não se vê, você não é visto”, ela afirmou, reforçando a importância de jogos com texturas audiovisuais que reflitam a diversidade. Segundo ela, estúdios que se dedicam à produção de games com diversidade real estão abrindo portas para que mais pessoas se sintam representadas.

Mudanças sociais através dos games e o papel da formação

Tanto Andreza quanto Guras concordaram que os games são ferramentas transformadoras, não apenas no entretenimento, mas na educação e no desenvolvimento de novas profissões. Andreza comentou sobre o papel fundamental que a formação de novos profissionais tem nesse cenário. Para ela, as iniciativas que investem na capacitação dos jovens das favelas são as que mais geram impacto positivo. “A formação permite entregar novos profissionais”, disse.

Outra solução apontada é a criação e fomentação de editais/concursos/oficinas promovidos pelo próprio Estado, políticas públicas voltadas para lazer. “É preciso entender o entretenimento como algo necessário”.

Plataformas de produção e democratização do conteúdo

Na visão de Andreza, as plataformas de produção de conteúdo precisam ser mais inclusivas e acessíveis. Ela criticou o algoritmo “viciado”, que favorece criadores grandes e muitas vezes brancos, e destacou que essas plataformas têm a responsabilidade de criar mais oportunidades para que novos talentos possam crescer. 

Ela também mencionou o podcast como uma grande mídia em ascensão, mas que ainda sofre com o preconceito de que apenas quem tem grandes recursos pode produzir conteúdo de qualidade. “É necessário que o mercado pare de fomentar os mesmos conteúdos. Precisamos estourar a bolha, democratizar e dar oportunidade, e isso é uma tarefa de todos”, reforçou.

Inclusão real ou marketing?

Andreza foi direta ao abordar um ponto sensível: a falsa diversidade promovida por algumas empresas. Muitas empresas falam sobre inclusão, mas na prática é só marketing. Ela mencionou uma situação com a própria BGS esse ano, onde percebeu essa falta de compromisso real. “As empresas precisam assumir o compromisso de verdade com a inclusão e o antirracismo, e não apenas colocar isso em campanhas para se promoverem”, reforçou. 

Segundo Andreza, a verdadeira transformação começa quando quem está nas posições de liderança também reflete essa diversidade, algo que ela ainda vê como um grande desafio no setor. “É preciso uma mudança de mentalidade”.

O futuro da favela nos games

Ao serem questionados sobre o futuro da favela nos games, foram otimistas, mas realistas. Andreza destacou que, embora os games estejam mudando vidas, ainda há muito a ser feito. “A favela ainda não venceu, falta inclusão e melhorias. Precisamos olhar para o entretenimento não como algo supérfluo, mas como uma via legítima de transformação de vidas.”

Ambos ressaltaram a importância de haver um compromisso sério por parte das empresas e das lideranças no combate ao preconceito e na criação de oportunidades reais para as favelas.

Mais do que um debate sobre inclusão, o painel foi uma reflexão sobre como os games podem ser catalisadores de mudança, tanto no âmbito social quanto no econômico. Para além do entretenimento, os games na favela são um grito por representatividade, oportunidade e transformação.