Calunguinha: A importância de ter histórias voltadas para crianças negras

Lucas e Stela falam sobre Calunguinha – O Cantador de Histórias, novo podcast original do Spotify.

Podcast é um formato de áudio que existe há muitos anos, mas nos últimos tempos tem se tornado cada vez mais comum. Calunguinha, O Cantador de Histórias, é o novo podcast do Spotify que conta a história de figuras negras da história do Brasil e do mundo. 

O projeto foi criado por Lucas Moura e Stela Nasrine e faz parte do projeto Sound Up, uma iniciativa global do Spotify que apoia jovens de comunidades sub-representadas no desenvolvimento e capacitação para criação de conteúdo em áudio. 

Stela Nasrine, que é artista, fala sobre sua trajetória na igreja e também na música, que a ajudou a alcançar outros patamares em sua vida acadêmica. Ela diz que passou por diversos trabalhos, tentando juntar conhecimentos básicos para empreender seus próprios projetos: 

Na minha adolescência, ouvindo Racionais, comecei a ter uma consciência de classe racial e minha vida começou a mirar para lugar um lugar onde meus trabalhos precisam dar uma continuidade a isso que nossos mais velhos fizeram, a continuar abrindo essa mata com o facão. 

Lucas nasceu em Vila Palmares, bairro da periferia de Santo André que tem em sua maioria pessoas negras e nordestinas. Ele diz que sempre quis ser rapper, mas sua falta de flow, ele acabou embarcando no teatro, que ele faz parte desde 2008. 

Foi dai que nasceu Calunguinha, da trajetória de Stela na educação e também com a maternidade. Junto com Lucas, ambos puderam juntar suas experiências para construir o projeto. Lucas já pensava no Calunguinha como um personagem para o teatro e diz como surgiu o personagem:

Um dia eu estava em um terreiro e baixou um exu mirim lá. E ele ganhou um boneco e deu o nome de Lucas e falou “Olha, a gente vai estar ligado pra sempre. Eu vou dar o nome desse presente que ganhei de Lucas”. Quando eu fui criar o personagem eu coloquei de Calunguinha, nome do exu mirim. Foi uma boa forma de retribuir o presente. 

Lucas diz que a ideia veio quando eles faziam Caetaninho, filho de Stela, tentar dormir à noite. Após esgotarem diversas canções infantis e histórias para ninar, eles começaram a pensar que seria interessante ter algo novo para as crianças ouvirem, algo além das histórias saturadas como Chapeuzinho Vermelho e outros contos infantis. 

O episódio já está disponível no Spotify:

O principal argumento de Stela é em relação ao quanto as crianças de hoje usam bastante a tela do celular, impedindo com que crianças descansem. Ela complementa dizendo que a experiência do áudio traz uma grande imersão: 

Existe uma potência do áudio de quando falamos do avô, como do Calunguinha na história, pode ser qualquer avó, o seu, o meu ou até um que você nunca conheceu. Ele não tem uma cor, jeito, se é alto ou magro… ele é apenas o avô […] o Calunguinha tem feito eu imaginar o que meu avó me falaria, principalmente pelo que me contam. Isso é muito importante, a gente tem muito da nossa ancestralidade arrancada. 

“A possibilidade da gente imaginar o que nos foi tirado faz com que a memória que ficou no passado seja projetada para o futuro”

Lucas comenta que não tinha referências para personagens pretos quando era criança, a não ser o Super-Choque, personagem da DC Comics. Stela diz que o podcast é para construir as contra-narrativas colocando as figuras e potências negras como protagonistas. Ela complementa dizendo que o podcast pode dar autoestima para as crianças, e narra um momento com seu filho: 

O Caetano é meu filho com um homem branco e ele tem a pele mais escura que a minha, com um cabelo onduladinho. Não acho que as pessoas vão ler ele como negro, mas um dia ele me olhou e perguntou “Mãe, eu sou negro, né?”. Eu respondi “Filho, acho que muitas pessoas não vão entender que você é negro, mas pode ter certeza que um monte de ancestral pretinho você tem.”

Stela diz que se surpreendeu porque Caetano falou como quem pergunta se é bonito, buscando uma afirmação, sendo que há alguns anos parecia impossível que uma criança associasse a ideia de ser negro a ideia de ser bonito. E é essa autoestima que Stela e Lucas tentam proporcionar a todas as crianças negras através de seu trabalho.

“O Calunguinha é para todas as crianças, seja as grandes com barba como as pequenininhas.”