
por Redação PerifaCon
Aquaman e o Reino Perdido põe fim à Era DCEU como uma clássica aventura em família
Novo filme do Aquaman marca o fim do universo compartilhado da DC.
Texto por Larissa Ibume Moreira
Se você quer mergulhar por um universo esplêndido no fundo do oceano, com tons neon e criaturas fantásticas, guiado por “Born to be Wild” de Steppenwolf, Aquaman e o Reino Perdido é o destino certo. O diretor James Wan promove com maestria cenas de encher os olhos com cores, formas, detalhes e um toque nostálgico de tecnologia de ficção científica dos anos 80.
Não significa que o enredo seja deslumbrante tanto quanto o cenário. Em alguns momentos os efeitos visuais erram a mão, mas dão a sensação de estarmos imersos em uma revista em quadrinhos de décadas passadas ou em uma aventura juvenil. Por falar em época, o filme é um elogio à Era de Prata dos quadrinhos do herói com referências acentuadas em figurinos, cenários, e no próprio enredo.
Numa evolução na jornada do herói, Arthur Curry (Jason Momoa), antes um bad boy que percorria o mundo completamente perdido, escondendo-se de seu propósito, agora é rei de Atlântida, marido de Mera (Amber Heard), pai dedicado a Arthur Júnior. A sobrecarga de obrigações dá o tom da frustração de Arthur, incumbido pelo sangue e destino a ser a ponte entre a terra e o mar. Dividir-se entre os dois territórios é um grande dilema, mas o filme caminha para o encontro de uma terceira margem e seu amadurecimento nessa empreitada.
Aquaman e o Reino Perdido é um filme sobre família e este é seu ponto forte. As cenas paternas são um deleite para quem gosta da possibilidade de experienciar a vida do herói em seus bastidores, quando não está em ação, e arranca sorrisos “fofos” do público. Quando Arthur decide se aliar ao meio-irmão e antigo inimigo, Orm (Patrick Wilson), os dois criam uma conexão inesperada, entre o descontraído e o sério, especialmente pelo esforço do irmão mais velho em ser reconhecido nesse lugar.

O “bromance”, foco principal das relações no filme, garante a comédia do enredo e, por muitas vezes, lembra Thor e Loki da franquia rival. Quem assistir, claramente entenderá a referência ao vilão da concorrência. Também confere um fechamento de arco digno a Orm e é quem ajuda Arthur a amadurecer como rei. No entanto, a dinâmica entre Arthur e Orm não funcionou tão bem quanto Arthur e Mera co protagonizando o primeiro filme, a troca entre irmãos é afetada pela qualidade do roteiro, embora haja química inegável entre os protagonistas. Por falar em comédia, carro-chefe do roteiro, ela perde o tom em alguns momentos com piadas clichês um tanto fora de hora que, ao invés de causar risos, geram um certo desconforto. Mas o carisma dos personagens é inegável.
Para além da comédia o filme possui uma carga dramática que contrasta e, em muitos momentos, destoa da mesma. Há um corte bruto onde se deve instigar o riso e onde se instiga a emoção. É no drama que o enredo se faz melhor, ganha notas de profundidade, mas com cenas que infelizmente são cortadas por telas pretas e não ganham continuidade. A transição entre cenas é um dos pontos frágeis do filme e muito se explica pela quantidade de regravações, foram três no total.
As cenas de ação são intensas e bem coreografadas, e ocupam boa parte da jornada de Arthur. Takes de Atlanna (Nicole Kidman) e, principalmente, Mera em ação roubam a cena por causa da descentralização da figura feminina nessa nova empreitada. A atuação de Yayah Abdul Mateen II merece atenção, ele encarna a própria vingança como Arraia Negra em sua busca estratégica e sem limites para fazer com que doa em Arthur a mesma dor que sentiu quando perdeu o pai. O enredo conseguiu aprofundar sua motivação e mantê-la consistente até o final.
A ausência de Vulko havia sido justificada no quadrinho prequel do filme, “Aquaman and the Lost Kingdom – Special #1” lançado em Outubro nos EUA, no qual o personagem interpretado por Willian Defoe entra em coma depois de um ataque de Charybdis, clássico vilão de Aquaman. No entanto, o filme guarda outra explicação. Fato é que a agenda do ator não foi compatível com as gravações e sua falta é sentida.
A trilha sonora surpreende negativamente. Um dos pontos fortes do primeiro filme, nesse deixa a desejar. Rupert Gregson-Willians não inova, reaproveitando-a.
Apesar da pouca profundidade do roteiro, o filme é político à maneira em que traz à tona os problemas climáticos que a humanidade enfrenta. O colapso global é iminente e passa pela forma como os oceanos vêm sendo realmente massacrados pelos verdadeiros “vilões” da vida fora das telas. Tal questão é a motivação necessária para que Arthur cumpra sua jornada.
Pelas previsões das bilheterias, o filme não alcançará, nem de perto, o estrondoso sucesso do primeiro filme que galgou a casa de 1 bilhão, único filme da franquia com este feito. Muito se fala da estafa de filmes de super-heróis, mas Aquaman e o Reino Perdido tem seu próprio motor de desânimo para os fãs. Ele encerra o DCEU e a precipitada revelação, ou boato, de que Jason Momoa deixará o papel para entrar em outro personagem, o Lobo, fez com que o público se retraísse. Não sabemos se na Era James Gunn haverá espaço para o reboot de um herói que ficou tão marcado pelo ator que o interpretou e ganhou contornos de personalidade do mesmo.

Apesar de esconder Mera nos trailers e na divulgação, algo que mais se pareceu com uma punição misógina da grande indústria do entretenimento a uma vítima de violência doméstica e de uma grandiosa campanha de difamação, a personagem mostra o porquê não é uma simples coadjuvante. Suas aparições, mesmo minúsculas, são marcantes. Quem conhece o universo de Aquaman sabe que Mera é muito mais do que um interesse romântico do herói, mas uma heroína por si só, sendo, por muitas vezes, mais poderosa que o próprio Aquaman. Toda divulgação do filme a colocou num papel sem importância, o que não reflete sua presença na tela. Ela roubou a cena no primeiro filme popularizando a personagem e alavancando a audiência, bem como rouba a cena, mesmo que num papel menor, totalmente picotado para não desagradar fandons furiosos. Fica evidente aos olhares atentos que suas cenas são entradas rápidas sem continuidade, quase sempre em segundo plano, e outros personagens vieram a ocupar um papel que deveria ser da personagem.
O último a sair apaga as luzes. É o que diz o ditado, mas é no acender das luzes do cinema que sabemos ser o fim de uma era de heróis. Pena que a cena pós-crédito não soube aproveitar o tom da despedida. Aquaman encerra uma fase recheada de controvérsias, épicos, fracassos, inconsistências e surpresas, mas é em si, para muitos desacreditados, uma surpresa agradável. Não supera o primeiro, mas cumpre seu papel em aprofundar a vida de Arthur, diverte e emociona, tudo em dosagem pouca, não há nada de profundeza. Ele deixa a espera de que a nova fase da DC traga um universo que possa ser, sobretudo, consistente, algo que não foi até agora.
A despedida foi, no mínimo, divertida com doses de emoção, e vale a pena para quem gosta de uma clássica aventura em família.